Segredos de tio Jó: A PRESENÇA
Era uma noite calma, de aparência comum. O silêncio era quebrado ao longe por alguns urutaus, cuja voz misteriosa a maioria confundia com a de corujas. A lua enchia os céus com sua claridade prateada, porém os namorados já tinham ido dormir, como todo mundo.
Nem todo mundo. A madrugada avançava vagarosamente, mas um
casal separado pela distância permanecia por horas ao telefone. Ora trocavam ideias,
ora cantavam, mas sempre terminavam suas conferências sem pressa, com oração.
E era então que acontecimentos inesperados
sobrevinham.
Não era um relacionamento entre dois amores, e era. Na verdade tio
Jó era o mentor da estudante. Era um relacionamento de mestre e aluna. Ele começou
a vida como professor. Ela, muito mais jovem, agora trabalhava como bibliotecária,
e tinha um nome hebraico que significava mais ou menos “minha agradável doçura”.
Naquela noite relembraram a magnífica apresentação no Teatro Guarani,
anos antes. O professor percorreu a cidade em busca da família, porque as duas irmãs
haviam gravado duetos deliciosos na igreja. A mais velha tinha uma voz
maravilhosa e cantava “La Paloma” e “Nabucco” como ninguém. Porém, ao procurar,
tio Jó soube que se haviam mudado para longe, e só a mais nova permaneceu temporariamente
na cidade.
Então o professor procurou a estudante, com o fim de comprar entrada
para dois, mas, sabe-se lá porquê, não conseguiu encontrar. Assim, de certo
modo, embora bem acompanhado e no meio de uma multidão, assistiu sozinho, porque
as amigas profundamente afeiçoadas à música não estavam ali.
Curiosamente, na noite seguinte a moça foi visitá-lo! Então soube
que perdera a ópera bíblica Nabucco! O professor se empenhou em mostrar trechos
gravados e descrever a beleza da montagem e das cenas. O momento mais especial,
sem dúvida, é a ária espetacular com os hebreus acorrentados junto ao Rio
Quebrar, com harpas penduradas em salgueiros. Fortemente vigiados pelos soldados
assírios, oravam: “Va pensiero, sull’ ali dorate…” e um luar como o desta noite
era projetado no fundo.
Os dois se lembraram: enquanto tio Jó tentava descrever
aquele momento inesquecível, a mocinha não conseguia esconder as lágrimas! Aquilo
serviu para estreitarem ainda mais a amizade que pensavam ser imorredoura.
Esta madrugada já ia alta e, caso não desligassem, corriam o
risco de amanhecer ao telefone e perder a hora do trabalho matinal. Os assuntos
foram edificantes. A afinidade e o entrosamento se mostraram imensos, tanto ao
conversarem sobre a Bíblia quanto a respeito de neurolinguística e carências.
No final, tudo contribuiu para a oração conjunta em plena comunhão. Os assuntos
apresentados diante de Deus foram os mais variados, e a intensa busca pela presença
de Deus os manteve unidos em espírito durante mais de uma hora.
No entanto, aqui nada é eterno. A oração tinha que ser
encerrada, porque precisavam dormir. Depois do amém, ambos se desejaram um
restante de noite pleno de bênção e restauração das energias de ambos, e confirmaram
o desejo de que a presença de Deus os enchesse.
Quando tio Jó ia dizer “boa noite”, a mocinha o surpreendeu:
– Tu estás sentindo aí o mesmo que eu estou sentindo aqui?
Tio Jó confirmou. Afinal, ele tinha experiências gloriosas, inclusive
da tarde memorável em que Deus se manifestou de maneira inusitada: primeiro foi
a doçura do Espírito Santo compartilhando os sentimentos, depois o Pai energicamente
mandando fazer a entrega do “tesouro”, e então o Senhor Jesus presente na sala, recebendo as lágrimas da
entrega com um abraço, um olhar penetrante e um sorriso magnífico!
Agora, a suavidade da doçura da presença do Espírito Santo era
tão intensa que ungia cada átomo do ar que ambos respiravam, e enchia as duas salas
em que haviam orado, mesmo estando a centenas de quilômetros um do outro!
Como se sabe, repito: aqui nada é eterno. Basta não vigiarmos;
basta darmos lugar à carnalidade; perdemos a continuidade da bênção. Mas basta
o arrependimento e a conversão dos maus caminhos, a restauração do altar e da busca
perseverante para o Amor de Deus e a graça do Espírito Santo encherem novamente os
corações.
A Bíblia profetiza que “a glória do Senhor encherá a terra”.
A promessa não é apenas para um futuro imprevisível. O mesmo Jesus disse: “eis que
eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”. Ele também foi
quem prometeu enviar o Espírito Santo para estar sempre conosco. A Palavra dele
também afirma: “os que de madrugada me buscam me acharão”. Só não recebe quem
não busca.
Tio Jó e sua “minha agradável doçura” buscaram até Deus manifestar-se
de maneira doce, suave, intensa e inesquecível.
ASSIM É A PRESENÇA.
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